O Caso da Mulher Adúltera: Como Jesus Aplicou a Lei de Deus na Íntegra
Vamos analisar o contexto jurídico da Torá, as exigências legais para um caso de adultério, a autoridade do Sinédrio, e como a resposta de Jesus (Yeshua) subverte expectativas sem violar a Lei. Reunirei dados da Torá, textos rabínicos (Mishná, Talmud), e entendimentos de sábios judeus medievais e modernos.
1. A Lei da Torá sobre Adultério
A base legal está em dois textos:
a) Levítico 20:10
“Se um homem cometer adultério com a mulher de outro, ambos serão mortos.”
Hebraico: “מוֹת יוּמַת הַנֹּאֵף וְהַנֹּאָפֶת”
- Exigências:
- Dois culpados: O homem e a mulher devem ser julgados.
- Testemunhas oculares: Duas testemunhas que viram o ato (Deuteronômio 19:15).
b) Deuteronômio 22:22-24
“Se um homem for achado deitado com uma mulher casada, ambos morrerão.”
- Detalhe crucial: A pena é apedrejamento (v. 24).
- Condição: A mulher deve estar casada (não solteira ou noiva).
2. O Processo Legal no Sinédrio
A Mishná (Sanhedrin 4:1) e o Talmud (Sanhedrin 37a) detalham como julgamentos de vida ou morte eram conduzidos:
- Testemunhas qualificadas:
- Duas testemunhas que viram o ato ocorrer (não ouviram falar).
- Devem avisar os acusados antes do ato (hatra’ah): “Saiba que adultério é punido com morte!” (Mishná Makkot 1:9).
- Ausência do homem:
- Se apenas a mulher é apresentada, o caso é inviável – a Torá exige julgamento de ambos (Levítico 20:10).
- Autoridade exclusiva do Sinédrio:
- No século I, o Sinédrio em Jerusalém era o único tribunal autorizado a julgar casos capitais (Mishná Sanhedrin 1:5).
- Yeshua, não sendo membro do Sinédrio, não tinha jurisdição para condenar a mulher.
3. Problemas Jurídicos no Caso da Mulher Adúltera (João 8:1-11)
a) Violações Processuais:
- Ausência do homem: Nenhum texto menciona o parceiro.
- Testemunhas não qualificadas: Os fariseus são acusadores, não testemunhas oculares (não descrevem o ato).
- Falta de hatra’ah: Não há evidência de que a mulher foi avisada antes.
b) O Julgamento de Yeshua
Yeshua sabia que o caso era ilegítimo pela Torá. Sua resposta – “Quem não tem pecado, atire a primeira pedra” – expõe três falhas:
- Incompetência das testemunhas: Se eles fossem testemunhas válidas, deveriam iniciar o apedrejamento (Deuteronômio 17:7).
- Hipocrisia: Eles mesmos violaram a Torá ao não apresentar o homem (Levítico 20:10).
- Usurpação de autoridade: Tentaram forçar Yeshua a substituir o Sinédrio, armando uma cilha política (João 8:6).
4. Comentários de Sábios Judeus
a) Maimônides (Rambam, século XII)
Em Mishneh Torah (Sanhedrin 18:6), ele afirma:
“Se as testemunhas não trouxerem ambos os adúlteros, o tribunal não pode julgar.”
b) Nachmânides (Ramban, século XIII)
Em Commentary on Deuteronomy 22:22, ele ressalta:
“A Torá exige justiça igual para homem e mulher. Ignorar isso é corromper a Lei.”
c) Rabino Joseph Karo (século XVI)
No Shulchan Aruch (Choshen Mishpat 34:18), ele explica:
“Testemunhas em casos capitais devem ser examinadas sete vezes. Qualquer erro invalida o caso.”
5. O “Dedo” de Yeshua e a Torá
Yeshua escreve no chão (João 8:6,8), gesto que ecoa dois textos:
- Jeremias 17:13
- “Os que abandonam o Senhor serão escritos no pó” – símbolo de julgamento passageiro.
- Êxodo 31:18
- “Tábuas escritas pelo dedo de Deus” – a Lei que condena.
Interpretação possível:
- Yeshua mostra que os acusadores, não a mulher, estão “escritos no pó” (condenados pela própria Torá que violaram).
- Ao perdoar a mulher, Ele não anula a Torá, mas aplica Oséias 6:6 (“Misericórdia quero, não sacrifícios”).
6. O Princípio da “Dúvida Benigna” (הלכה כספק קולא)
Na jurisprudência judaica, em casos de dúvida, prevalece a absolvição (Mishná Sanhedrin 4:1). Como não havia provas contra a mulher (nem o homem), Yeshua age como um juiz piedoso, seguindo:
- Provérbios 21:3 – “Praticar justiça e retidão é mais aceitável ao Senhor que sacrifício.”
- Isaías 1:17 – “Aprendei a fazer o bem; buscai a justiça.”
7. Conclusão: Yeshua e a Torá em Harmonia
- Yeshua não condena a mulher porque:
- O processo era ilegítimo (falta de testemunhas, ausência do homem).
- O Sinédrio, não Ele, tinha autoridade.
- “Quem não tem pecado…” não é uma negação da Torá, mas uma exposição da hipocrisia dos acusadores (cf. Mateus 7:1-5).
- Perdão ≠ Anulação da Lei: A graça pressupõe a Lei – Ele diz: “Vá e não peques mais” (João 8:11), confirmando que o adultério é pecado.
Fontes Recomendadas:
- David Instone-Brewer, Divorce and Remarriage in the Bible (análise do contexto jurídico).
- Brad H. Young, Jesus the Jewish Theologian (Yeshua dentro do judaísmo do século I).
- Talmud Babilônico, Tratado Sanhedrin (procedimentos legais).
Yeshua, longe de descumprir a Torá, cumpriu-a em espírito, mostrando que a justiça divina é misericórdia para os arrependidos e rigor para os hipócritas. 📜⚖️
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