O “Arrependimento” de Deus: Uma Contradição ou Um Mistério?

“Deus não é homem para que minta, nem filho do homem para que se arrependa.” (Números 23:19)
“Então o Senhor se arrependeu de haver feito o homem sobre a terra e pesou-lhe em Seu coração.” (Gênesis 6:6)
A Bíblia apresenta duas afirmações aparentemente contraditórias: Deus não se arrepende, mas ao mesmo tempo Ele se arrepende. Como podemos conciliar essas declarações?
A resposta para essa questão envolve linguística hebraica, filosofia, teoria literária e a compreensão da relação entre a dimensão terrena e a transcendental.
Vamos explorar como o conceito de “arrependimento divino” pode ser compreendido através do hebraico bíblico, da literatura rabínica e da revelação messiânica em Yeshua.
📖 O Texto Bíblico em Hebraico e Português
Textos que dizem que Deus NÃO se arrepende
לֹ֣א אִ֥ישׁ אֵל֙ וִֽיכַזֵּ֔ב וּבֶן־אָדָ֖ם וְיִתְנֶחָ֑ם
“Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa.” (Números 23:19)
וְגַם֙ נֵ֣צַח יִשְׂרָאֵ֔ל לֹ֥א יְשַׁקֵּ֖ר וְלֹ֣א יִנָּחֵ֑ם כִּ֣י לֹ֥א אָדָ֛ם ה֖וּא לְהִנָּחֵֽם׃
“E também aquele que é a Força de Israel não mente nem se arrepende, pois não é um homem para que se arrependa.” (1 Samuel 15:29)
Textos que dizem que Deus SE arrepende
וַיִּנָּ֖חֶם יְהֹוָ֑ה עַל־הָ֣רָעָ֔ה אֲשֶׁ֥ר דִּבֶּ֖ר לַעֲשׂ֥וֹת לְעַמּֽוֹ׃
“Então o Senhor se arrependeu do mal que dissera que havia de fazer ao Seu povo.” (Êxodo 32:14)
וַיהֹוָ֣ה נִחָ֔ם כִּֽי־הִמְלִ֥יךְ אֶת־שָׁא֖וּל עַל־יִשְׂרָאֵֽל׃
“E o Senhor se arrependeu de haver posto a Saul rei sobre Israel.” (1 Samuel 15:35)
Essas passagens parecem se contradizer. Mas ao analisarmos a semântica do hebraico bíblico, percebemos que o conceito de “arrependimento” no contexto divino é diferente do entendimento humano.
🔍 A Linguagem Hebraica e a Voz Passiva no “Arrependimento Divino”
A palavra hebraica para “arrependimento” nesses textos é נָחַם (nacham). Esse verbo aparece em duas construções diferentes:
1️⃣ Na voz reflexiva (Hitpael) → Deus não se arrepende por si mesmo.
2️⃣ Na voz passiva (Nifal) → Deus “é levado ao arrependimento” por fatores externos.
📜 Chazal (nossos sábios) ensinam:
“O Eterno não muda, mas reage conforme as ações dos homens.” (Resumo de Midrash Tanchuma, Vayera 5)
Ou seja, o arrependimento divino não é uma mudança de caráter, mas uma resposta à mudança da humanidade.
🎭 A Literatura e o “Arrependimento” como Antropomorfismo
Na teoria da literatura, um antropomorfismo ocorre quando características humanas são atribuídas a Deus.
Exemplos na Bíblia:
- Deus “ouve” (Êxodo 3:7).
- Deus “vê” (Gênesis 16:13).
- Deus “anda” (Gênesis 3:8).
- Deus “se arrepende” (Gênesis 6:6).
A tradição rabínica e messiânica concorda que essas expressões não indicam mudança essencial em Deus, mas formas de comunicação que os humanos podem compreender.
📜 O Talmud Bavli (Berakhot 31b) ensina:
“A Torá fala na linguagem dos homens.”
⚖️ O Arrependimento Divino e o Tribunal Celestial
Na tradição judaica, há um conceito de tribunal celestial, onde os pecados humanos são apresentados diante de Elohim.
- O acusador (שָׂטָן – satan) acusa os homens diante de Deus (Jó 1:6-12).
- O advogado (סָנֵגוֹר – sanegor) intercede (Moisés em Êxodo 32:11-14).
📜 A síntese presente no Midrash Shemot Rabbah 44:9 diz:
“Se um justo se levantar e interceder, o decreto pode ser anulado.”
Isso explica passagens como a de Moisés intercedendo pelo povo e Deus “mudando de ideia”. O “arrependimento divino” é a resposta à intercessão e ao arrependimento humano.
🧐 A Filosofia e o Conceito de Mudança em Deus
Na filosofia grega, Parmênides e Platão ensinavam que um ser perfeito não pode mudar. Isso gerou a ideia cristã clássica de que Deus é imutável (imutabilidade divina).
📜 Aristóteles, em “Metafísica” (XII, 6-9), descreve Deus como o “motor imóvel” – aquele que move tudo sem ser movido.
Mas na Bíblia, Deus interage com a criação. A filosofia judaica, especialmente em Maimônides (Guia dos Perplexos), ensina que Deus não muda em essência, mas Suas ações podem se manifestar de maneiras diferentes conforme a situação.
🌿 A Mensagem Messiânica: Yeshua como o “Advogado” que Garante o Perdão
“Se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Yeshua HaMashiach, o Justo.” (1 João 2:1)
No tribunal celestial, o ser humano não pode se defender sozinho. Mas Yeshua, como nosso intercessor e mediador, garante que a misericórdia divina prevaleça sobre o juízo.
📜 The Great Mystery: Or, How Can Three Be One ensina que Yeshua, como a “Palavra de Elohim”, é a plenitude da manifestação divina, garantindo que a justiça e o amor estejam perfeitamente alinhados.
🎯 Conclusão: Deus Não Muda, Mas Interage Com a Humanidade
1️⃣ Deus não se arrepende como os humanos, mas responde às ações humanas.
2️⃣ A linguagem bíblica usa antropomorfismos para descrever Deus.
3️⃣ A justiça divina é balanceada pela intercessão dos justos.
4️⃣ Yeshua é o intercessor perfeito, garantindo a misericórdia e redenção.
📜 Pergunta para reflexão:
Se o arrependimento humano pode mudar os decretos divinos, não deveríamos buscar uma vida de Teshuvá (retorno a Deus) constantemente?
“Aquele que tem ouvidos para ouvir, ouça!” (Mateus 11:15)
📖 Referências
- Tanach – Texto Massorético
- Midrash Tanchuma, Vayera 5 – O arrependimento divino como resposta.
- Talmud Bavli, Berakhot 31b – A Torá fala na linguagem dos homens.
- 1 João 2:1 – Yeshua como o Advogado Celestial.
- The Great Mystery: Or, How Can Three Be One – Unidade e manifestação divina.
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