Por que a Genealogia de Jesus foi por meio de Maria? Estudo Judaico-Messiânico
Se olharmos com cuidado, o padrão bíblico da genealogia é, de fato, patriarcal: “filho de” (ben + nome do pai), passando pelo lado masculino.
Porém, em dois textos-chave que falam sobre o Messias, a narrativa quebra esse padrão e dá protagonismo à mulher — algo raro e teologicamente carregado.
1. O deslocamento em Gênesis 3:15
E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente… Gênesis 3:15
Aqui a tradução para o português oculta a totalidade da intenção do verso. Veja abaixo como o hebraico reaviva essa revelação fantástica:
וְאֵיבָה אָשִׁית בֵּינְךָ וּבֵין הָאִשָּׁה וּבֵין זַרְעֲךָ וּבֵין זַרְעָהּ
“…entre a tua semente e a semente dela.”
📌 Observações linguísticas:
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זרע (zéra) é um substantivo masculino, mas aqui aparece com sufixo pronominal feminino: זרעהּ (zar‘ah) — “a semente dela”.
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O hebraico bíblico normalmente associa zéra à descendência masculina (porque é “semente” no sentido fisiológico e genealógico).
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Mas aqui, a estrutura é anômala: a “semente” é atribuída à mulher sem menção de homem.
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Isso cria um “frame” profético: o descendente vitorioso virá sem a mediação de um pai humano.
💬 Sentido teológico: o texto não está falando de “linhagem feminina” como se fosse uma inversão sociológica do patriarcado; está apontando para um caso excepcional, fora da norma, como se dissesse: a linhagem messiânica, neste ponto, não virá pelo caminho usual.
2. O eco em Gênesis 4:25 – A “outra semente”
Eva, ao receber Sete, declara:
כִּי שָׁת־לִי אֱלֹהִים זֶרַע אַחֵר — “Deus me concedeu outra semente…”
📌 Relação com Gênesis 3:15:
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Novamente, a mãe é o sujeito da declaração sobre a “semente”.
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Acher (“outro/diferente”) reforça a ideia de uma origem qualitativamente distinta do Messias.
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O livro da tradição judaica Bereshit Rabbah interpreta: “De outro lugar. Quem é este? Este é o Rei Messias.”
💬 Sentido teológico: O Midrash (a tradição judaica no livro acima citado) reconhece que a promessa messiânica não está amarrada rigidamente à ordem natural — pode “pular” para outra rota, inclusive via protagonismo feminino.
3. O deslocamento em Isaías 7:14
הִנֵּה הָעַלְמָה הָרָה וְיֹלֶדֶת בֵּן
“Eis que a jovem conceberá e dará à luz um filho…”
📌 Observações:
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Não há menção de pai; a jovem (הָעַלְמָה) é o sujeito ativo.
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A concepção é o sinal de Deus, indicando que a origem da criança está fora do padrão reprodutivo comum.
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Na tradição messiânica, este texto ecoa a mesma estrutura profética de Gênesis: nascimento com protagonismo materno único.
4. A crítica antimissionária e a resposta textual
A crítica diz: “Se a genealogia é pelo pai, como pode a mãe de Yeshua ser central?”
📜 Resposta a partir do Tanach:
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O Tanach já aponta, profeticamente, para um caso em que a descendência messiânica seria atribuída à mulher (zar‘ah em Genesis 3:15), sem o registro normal via pai humano.
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Isso não elimina a genealogia patriarcal de Yeshua em Lucas — que mostra sua legitimidade davídica legalmente (pela linhagem de José) e biologicamente (pela linhagem de Maria em Mateus).
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Mas sim, desloca a origem para um campo teológico-profético: o Messias é filho de Davi por direito, mas nascido “de outro lugar” — do ventre de uma mulher, por ação direta de Deus.
5. Aplicação devocional
O protagonismo feminino nesses textos não é um “acidente gramatical”:
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É uma marca profética de que Deus escolhe o improvável.
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É uma lembrança de que a salvação não vem da força da carne nem da tradição humana, mas do agir soberano do Eterno.
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É também um consolo: quando o caminho parece fechado pelas estruturas humanas (como a genealogia patriarcal), Deus abre uma rota “de outro lugar”.
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